Beatriz Guarezi é criadora de conteúdo, TedX Speaker, especialista em branding e dona de uma newsletter com mais de 35 mil assinantes (Bits to Brands).
Neste HackTown, ela lotou a sala com uma palestra muito interessante, chamada “Criadores precisam ser curadores”.
Bia apresenta a curadoria como uma forma de criação, que usa coisas existentes para criar algo que é maior que a soma das partes componentes. Defende que curadoria de verdade não é uma mera colagem, mas a concepção de uma narrativa nova, a partir de uma perspectiva, opinião ou filtros pessoais e originais.
É uma habilidade com muitas características humanas, e especialmente importante hoje, diante da revolução causada pela seleção de conteúdo automatizada e feita por IA e dados. Como exemplo, ela compartilha a forma como o Tik Tok seleciona e apresenta os conteúdos para o usuário, com uma velocidade, precisão e atratividade incríveis.
A seleção automatizada e pessoal de conteúdo feita pela plataforma é, de certa forma, uma curadoria automática. No entanto, tem como única intenção “ampliar o tempo de tela” e não necessariamente educá-lo ou fazê-lo ampliar perspectivas.
Hoje, já há newsletters com milhões de assinantes como Daily Skim, The Hustle e Morning Brew (que foi comprada por 75 milhões de dólares). E há também exemplos de modelos de negócio baseados em curadoria que vão além das Newsletters.
Em 2016, a atriz Reese Witherspoon iniciou uma curadoria pública de livros que trazem mulheres no centro da história. Cinco anos depois, a Reese’s Book Club recebeu um investimento de 500 milhões de dólares, numa avaliação de 900 milhões de dólares.
Beatriz comenta que na geração do excesso de informação, a curadoria é uma questão de sobrevivência, e também uma forma de expressão em si mesma.
O conteúdo cumpre muitas funções na nossa vida, desde entretenimento até a conexão com nossos pares, amigos, familiares e colegas. Do grupo do WhatsApp da vovó, até o meme da turma do futebol ou do BBB, passando pelas referências e estudos profissionais. E tudo tem o seu espaço.
No entanto, Bia defende que é hora de pensarmos o consumo de informação como o consumo de alimentação. Da mesma maneira que uma dieta equilibrada ajuda a manter o corpo saudável, o equilíbrio no tipo de conteúdo que se consome pode colaborar ativamente com a saúde mental.
Em outro trecho da palestra, Bia traz um exemplo de como ela e suas parceiras organizam a curadoria do TEDx Blumenau, com 4 macro-etapas:
Tudo parte de um grande tema, que pode ser tão amplo como “democracia” ou “sustentabilidade”. É o objetivo do que se quer discutir, o planeta central onde orbitam as palestras.
A partir da decisão do tema, são abordadas e discutidas as diferentes perspectivas, o contraditório, a abrangência (local, regional, global), o aprofundamento que o tema terá. É um processo bastante interativo e com várias dimensões.
Com esse mapa de ideias, o time começa a entender quem são os experts. Entender quem vivencia o tema e tem propriedade, uma perspectiva única ou vivência incrível sobre ele. Entender quais são as polêmicas, o contraditório, os debates possíveis. Assim, chega-se a uma lista de potenciais palestrantes.
Os palestrantes então são convidados e selecionados sob a perspectiva de relevância, originalidade e ineditismo das suas palestras para o contexto, espaço e local do TEDX. E por fim, chega-se ao lineup final, que é o que comporá aquela edição.
No trecho final da palestra, Bia trouxe uma visão muito legal da curadoria como uma extensão da vida cotidiana. Uma lente que se coloca para olhar o mundo com um interesse especial, com uma intenção diferente.
Você precisa criar um segundo cérebro organizado de uma forma que faça sentido para você.
Hoje em dia as ferramentas ajudam, especialmente as digitais. A sua pode ser um Trello, um Notion, um Confluence, pastas do drive ou até um caderno de colagens offline. Mas ela precisa existir.
A curadoria não é uma mera coleção aleatória de dados, textos e imagens. É uma narrativa que usa como ponto de partida o lugar, o contexto e a sua perspectiva individual para transferir sentido àquela coleção. Por isso, é uma atividade absolutamente humana. Envolve sensibilidade, olhar, opinião, curiosidade e aproveita-se muito da serendipidade.
Bia comenta que na hora de se capturar conteúdo, é interessante olhar para o que se tem de tema de preferência mas também para o que, por alguma razão ou por razão nenhuma te chamou a atenção. Por vezes, uma palestra sobre astrofísica pode trazer insights valiosos para uma pessoa que trabalha com moda. E vice-versa.
O olhar curioso, amplo, generoso e genuinamente interessado é a base de toda curadoria de alto impacto. E pode ser também um caminho para uma vida muito mais rica, multifacetada e interessante que a que te mostra o feed automatizado da sua rede social favorita.